31 de março de 2016

Entrevista com Inio Asano




Com uma de suas obras mais populares, "Solanin", tendo sido republicada recentemente aqui no Brasil pela editora L&PM, o prestigiado mangaká Inio Asano concedeu uma breve entrevista ao site americano Anime News Network, ocorrida durante um evento de anime e mangá no final do ano passado na Espanha - porém sua postagem no site ocorreu só agora, no último dia 22. Falando um pouco desde trabalhos já finalizados até o que permanece em andamento atualmente, sua entrevista foi traduzida na íntegra logo abaixo, incluindo a introdução. Clique aqui para ver a postagem original, feita por Manu G.

Aliás, "Nijigahara Holograph" será outro mangá seu a ser lançado no Brasil conforme anúncio da JBC em fevereiro, mas ainda não estipularam uma data para isso.



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Durante o último "Salón del Manga" em Barcelona, o maior evento de anime e mangá na Espanha que ocorreu entre os dias 29 de outubro a 1º de novembro, nós tivemos a chance de falar com Inio Asano, mangaká responsável por títulos de sucesso como "Oyasumi Punpun", "Umibe no Onnanoko", "Nijigahara Holograph" e "Solanin". Partindo de suas reflexões a respeito da sociedade moderna até opiniões quanto ao mercado japonês e como isso influencia seu trabalho, outro tema destacado foi a sua abordagem no mangá ainda em andamento "Dead Dead Demon's Dededededestruction". Suas histórias procuram fazer você sentir emoções reais, isso através de uma forma ousada ao criar obras que andam de mãos dadas com as ideias e sensação geral de sua própria geração.



Todo mundo está falando de uma nova onda de mangakás liderada por você e Kengo Hanazawa (autor de "I Am a Hero"). Você sente alguma pressão e responsabilidade em viver de acordo com as expectativas dessa nova geração de leitores?

Sim, e falando em nome de Kengo Hanazawa creio que nós dois estamos conscientes da nossa posição e a responsabilidade que carregamos nos ombros. Queremos atender a essas expectativas e criar histórias que atinjam esse desafio que as pessoas nos deram.


Esses novos públicos parecem surgir conforme a sociedade evolui. Acha que seus trabalhos são um reflexo preciso dessa evolução, de como a cultura pop e a tecnologia mudaram, ou você pensa que estes elementos desempenham um papel independente na sua narrativa?

De fato, a sociedade está mudando, e isso é refletido no meu trabalho. O exemplo mais simples disso é como nós hoje trocamos informações pela internet, o que torna a comunicação nada parecida com o que era no passado.

Quanto a evolução mental da sociedade, a maneira que as pessoas pensam e sentem também está mudando o tempo todo. Um sujeito normal não interrompe seu dia para pensar nessas mudanças, e ele pode nem dar qualquer importância nelas, porém é verdade que conforme a sociedade evolui, começamos a encontrar novos tipos de problemas e diferentes assuntos para refletir a respeito - mesmo que não percebamos no momento. Mas há sim alguns autores contemporâneos como eu que dedicam seu tempo em focar nestes detalhes em seus projetos.


Há um forte componente no seu trabalho que procura cobrir quase todas as facetas da adolescência: sexo, educação, amizade. Você geralmente constrói tais histórias da adolescência se baseando nas suas próprias experiências ou nas de pessoas próximas?

Tenho certa vergonha em dizer isso, porém, para que eu possa criar histórias convincentes, preciso trazer os personagens o mais próximo possível de minhas próprias experiências. Logo é fato que eu e muitos dos meus personagens possuímos coisas em comum.

De qualquer forma, tento não fazer tramas baseadas nas experiências de um só personagem. Elas são histórias corais que dependem de vários personagens com papéis importantes apoiados em referências externas de pessoas próximas a mim. Preciso fazer dessa forma, pois caso contrário não poderia criar obras capazes de expressar um senso de realidade.


Você já debateu usando sexo nos seus mangás como um meio de criticar o ostracismo japonês nesse assunto, contudo qual é o papel que a sexualidade geralmente possui neles, e de que maneira você envolve diferentes personagens?

Especialmente no começo, quando comecei a trabalhar com mangás, eu pensava em descrições relacionadas a sexualidade como algo completamente normal, uma parte natural do nosso dia a dia onde podemos nos envolver em situações sexuais. Pra mim, o jeito mais natural de retratar a realidade é inclinar-se sobre essas caracterizações sexuais, no qual alguém pode ser visto almoçando em uma cena, e em seguida fazendo sexo na outra normalmente.

Entretanto, ultimamente me vi no meio de um ambiente desfavorável para o desenvolvimento de questões sexuais em meus mangás. É um elemento que recebe críticas com maior frequência do que eu gostaria, porém o Japão está começando a virar as costas para essas retratações, assim como vários leitores de mangás - é algo que pode ser percebido facilmente em opiniões populares de "Oyasumi Punpun" e "Umibe no Onnanoko" (esse último um mangá explícito de 2 volumes cuja história é sobre um casal de adolescentes, numa cidade litorânea, que tenta seguir com uma relação puramente sexual, sem emoções). Acredito que criei "Umibe no Onnanoko" na hora certa, pois fui capaz de atingir o último ponto em relação a sexualidade que eu gostaria de comunicar no papel de um mangaká. Na ocasião, imaginei que não seria capaz de criar isso no futuro, e preferi fazê-lo naquele momento enquanto sabia que ainda seria possível publicar esse material.


Ao lhe desencorajarem, você acredita estar sendo restringido de incluir sexo por ser algo visto como tabu?

Não exatamente. Há uma tendência em separar tudo por gênero. Digo, se um mangá é sobre ação, ele será apenas destinado a ação, e não há espaço nele para cenas de sexo - caso coloque situações sexuais na história as pessoas vão começar a perguntar algo do tipo "O que você está fazendo?". Isso também vai no sentido inverso: se alguém está criando um mangá erótico ou pornográfico, você deve ser capaz de perceber isso claramente pela capa do volume.

O que mais me incomoda é a questão do porque não ser possível colocar cenas de sexo em um mangá normal, visto que sexo é a coisa mais normal do mundo. É por essa razão que imagino que será cada vez mais e mais difícil inserir tais cenas nos meus mangás, pois editores e leitores não esperam ou não querem encontrar certos tipos de conteúdo numa história quando eles pensam que será algo diferente.



Falando sobre "Oyasumi Punpun" e o simbolismo usado na série, tais como os chifres de touro ou a transformação em pirâmide, você queria causar algum impacto no mangá ao deixar as coisas mais difíceis de serem entendidas pelos leitores, ou estava somente mostrando algum romantismo artístico?

Quando fiz "Oyasumi Punpun" eu estava criando um mangá sobre a psicologia humana, o qual poderia usar para explorar eu mesmo em um nível mental, projetando minha psique dentro da história. Tendo um mangá como forma de expressão, decidi por esse tipo de pássaro rabiscado como um código que me permitiria realizar experimentos com o ambiente e faria os leitores se identificar com ele. Em relação às mudanças na forma de Punpun, não há qualquer significado em particular, apenas fiquei cansado de reusar a do pássaro. (risos)



Enquanto lia seu trabalho mais recente, "Dead Dead Demon's Dededededestruction", o contraste entre desenhos especialmente infantis, quase moe, e o roteiro adulto típico de Asano foi impactante pra mim. O que o levou a esse estilo de desenho no mangá?

Finalmente alguém me fez essa pergunta! Este é o problema que tem me preocupado no momento. Quando um mangaká trabalha por um longo período suas histórias tendem a progredir na qualidade, mas ao mesmo tempo elas também se tornam mais complicadas.


Uma das minhas ambições é manter os jovens lendo o que faço. Não me importo se eles não entendem minhas histórias em sua totalidade. Os anos passarão, esses leitores estarão mais velhos e maduros e, talvez, peguem um dos meus mangás para ler de novo e assim compreendê-lo de uma forma bem diferente: isto é o que eu gostaria de ver acontecer como criador. Contudo, os leitores japoneses estão adquirindo gostos mais simplificados, não se apegam a histórias difíceis. O seu trabalho tem de ser atraente: se isso significa desenhar personagens com traços atrativos, até no estilo moe, para que assim as pessoas se sintam incentivadas a ler o mangá, não me importo em fazer isso para evitar rejeição imediata.

É o mesmo caso para "Oyasumi Punpun". Eu a acho uma história muito profunda, que tem bastante a dizer psicologicamente, mas a razão para que Punpun e sua família sejam esses símbolos estranhos é a fim de dar a impressão de que se trata de um mangá simples. As pessoas começarão a lê-lo pensando que é uma preleção leve, e então descobrirão que, na verdade, "Oyasumi Punpun" vai muito mais além disso.



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Clique aqui para visualizar outras entrevistas traduzidas.


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2 comentários:

  1. Eu acho que essa é a segunda vez que comento numa das entrevistas traduzidas do Sr. Erick. Eu tenho a capacidade pra conseguir ler as entrevistas na íntegra numa boa, mas as traduções são sempre tão cuidadosas e bem construídas que eu vejo-as por aqui.

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  2. Inio Asano um dos meus mangakas atuais favoritos, mt bacana a entrevista, as obras dele são mt reflexivas e as vezes chegam a ser melancolicas na minha opinião.
    Mas muto boas.

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